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O VALE DOS SONHOS PERDIDOS

AZUL_ORQUIDAL

A noite passada tive uma experiência fascinante.

Sonhei que estava viajando para um lugar muito diferente.

Era o Vale dos Sonhos Perdidos.

O vale é um lugar que não dá para definir bem, se montanha, beira-mar, floresta, deserto.

Na realidade acho que tem um pouco de cada coisa.

Entrei  por um portão estreito e fiquei maravilhado com oque vi, pois o panorama que se descortinou diante de mim era lindo, tendo todas a cores possíveis e algumas impossíveis.

Foi interessante que eu podia me deslocar de um lugar a outro como que voando e podia  ver e apreciar os sonhos das pessoas, sonhos que haviam sido sonhados e haviam sido abandonados, perdidos.

Olhei no horizonte e vi um  velhinho que caminhou em minha direção.

Era o Guardião do Vale dos Sonhos Perdidos.

Tinha o cabelo e a barba branca, e vestia uma túnica verde água, caminhava resoluto por entre os sonhos abandonados.

Quando se aproximou, me olhou bem e disse: Está procurando um de seus sonhos ?

Disse que não, mas que estava impressionado pela beleza do lugar e perguntei como poderia haver um lugar tão lindo assim e as pessoas não saberem dele.

Ele me disse que era o encarregado do Vale e que teria prazer em me mostrar o lugar e me dar as explicações necessárias.

Ele passou a falar: Este é um lugar que Deus destinou para guardar os sonhos que as pessoas já tiveram e abandonaram,  esqueceram ou perderam.

Um lugar que guarde os sonhos das pessoas só poderia ser um lugar muito bonito, pois os sonhos que as pessoas têm sempre são bonitos, coloridos, alguns muito grandes, outros pequenos, mas todos são sonhos que, um dia, ocuparam a mente,a energia e foram a preocupação das pessoas.

Começamos a caminhar, ou melhor, flutuar por entre os sonhos e ele começou a me descrever os sonhos ali guardados.

Este aqui, era de um rapaz que sonhou ser um grande médico, levar o alívio a muitas pessoas, curar e confortar.

Este outro era de uma moça que sonhou ser professora primária, ensinar as crianças a ler e escrever.

Este outro é de um jovem que sonhou ser político, para construir um país melhor.

Aquele ali é de uma jovem que sonhou casar e ter  diversos filhos, se dedicar a eles, amá-los, cria-los e encaminha-los na vida.

Aquela lá, bem azul, é de um jovem que sonhou ser piloto de avião, viajar pelo mundo todo, conduzindo as pessoas para conhecerem lugares lindos, encontrar entes queridos.

Este dois aqui são de dois irmãos, um rapaz e uma moça, que sonharam ser padre e freira, se dedicarem a levar a esperança para pessoas desesperadas em hospitais e lugares de pobreza.

Olha aquele lá, sonhado por um menino que queria ser militar, um grande general, conduzir as tropas na manutenção da paz.

Assim fomos flutuando entre os sonhos, todos lindos.

Sonhos de arquitetos, engenheiros, pais, mães, advogados, operários especializados, cientistas, professores. Notei que todos os sonhos tinham um núcleo muito vivo.

O Guardião me explicou que era o centro do sonho, aquele núcleo que, um dia, foi muito intenso, poderoso, colorido.

Perguntei-lhe, então, porque aqueles sonhos tinham sido abandonados.

Ele me olhou e vi tristeza em seus olhos: Os motivos são muitos, me respondeu. Uns eram sonhos de juventude, de infância e foram abandonados a medida que seus  donos foram crescendo e amadurecendo.

Outros foram abandonados por meros caprichos de seus  donos, trocados por outros mais fáceis.

Outros, ainda, por falta de condições, materiais, emocionais ou circunstanciais para torná-los realidade.

Eu já passei muito tempo conversando com esses sonhos e quando eles chegam aqui eu tenho de interrogá-los para saber a categoria, porque foram abandonados e destinar um lugar a eles.

Alguns chegam aqui pesarosos, pois foram trocados facilmente, esquecidos e nunca mais lembrados que um dia foram sonhados. Outros chegam pesarosos porque seus sonhadores não tiveram as condições de realiza-los e sofrem com isso.

Depois de passarmos muito tempo vendo os sonhos, perguntei-lhe se alguns dos meus sonhos estariam ali também.

Ele riu e disse que sim e me levou por cima de uma montanha de sonhos. Levei um susto ao identificar os muito sonhos que já tive e que, agora, jaziam ali, abandonados.

Senti que meus sonhos que olhavam tristes, como a perguntar: Por que me abandonou ? Lembrei de cada um, do momento de minha vida que o sonhei. Para alguns eu tinha explicação clara, para outros não.

Ao ver alguns dos meus sonhos abandonados ao longo de minha vida, fiquei com vontade de chorar, pois eram todos lindos e, alguns eu também abandonei por comodismo, fraqueza ou falta de coragem.

Não sei quanto tempo passei ali revendo meus sonhos e senti uma coisa estranha, parecia que alguns queriam ir comigo quando saísse dali.

Perguntei ao Guardião se isso seria possível, se poderia levar comigo alguns dos velhos sonhos.

Ele me respondeu: Sim, você pode levar todos os seus sonhos de volta, é só querer. Então lhe perguntei se as pessoas costumavam visitar o Vale e resgatar seus sonhos mais lindos .

Ele me olhou com um olhar de esperança e resignação e me disse: São poucas as pessoas que veem aqui em busca de seus sonhos abandonados. É verdade que alguns voltam e resgatam seus sonhos, mesmo depois de muito tempo.

Precisa ver a festa que eles fazem quando isso acontece, ao ver a pessoa sair daqui abraçado com seu sonho que, agora, já não será mais esquecido e que será o motivo central da vida do sonhador ou sonhadora.

Mas existem dois momentos em que todos eles se entristecem, pois todos os sonhos da humanidade estão entrelaçados e, de alguma maneira, se comunicam.

A primeira é quando alguém chega aqui, olha para seus sonhos e diz: como fui tolo a sonhar esse sonho, e vai embora.

O outro, é quando eles escutam, seus donos contando para os filhos, netos, esposo, esposa, ou amigos, que, um dia tiveram tal e tal sonho, mas que não puderam realiza-los.

Geralmente as pessoas relatam isso com um profundo pesar ou melancolia na voz e todo se entristecem junto.

Ele me pegou pelo braço e me levou para um canto do Vale. Estranhei, pois era um lugar sem cor, lúgubre, muito triste. Perguntei oque era aquilo e o Guardião me disse, pesaroso: Esses são os piores sonhos abandonados.

São os sonhos de ser feliz e que foram abandonados, esquecidos.

E sabe que esses são os sonhos  que mais tem chegado aqui ultimamente? Será que as pessoas estão se esquecendo de serem felizes?

Será que concluíram que não vale a pena lutar por esse sonho? Senti que era a hora de ir embora.

Ele me levou até o portão. Lancei um último olhar para o Vale e, de repente, acordei.

Não dormi mais, fiquei pensando, por horas, no Vale dos Sonhos Perdidos, nas pessoas que conheço e que um dia, sonharam sonhos lindos, mas os foram perdendo ao longo da vida.

Acho até que chorei.

Fiz uma promessa a mim mesmo: resgatar alguns dos meus sonhos,e, especialmente, não esquecer do mais importante deles: o de ser feliz.

Almeri Paulo Finger

pafi@onda.com.br

 

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